Camisa titular. CBRu/Divulgação

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ARTIGO OPINATIVO – A confirmação da troca da marca “Corinthians” pela marca “Cobras” para a franquia brasileira que disputará a SLAR (a nova liga profissional sul-americana) é, na minha visão, um acerto. Não sou contra a presença de clubes de futebol no rugby – sendo otimista, se suas torcidas abraçarem a cultura do rugby nos jogos de rugby, trazendo apenas seu lado positivo, não há razão para rejeitá-los. Paixão é sempre bem vinda, se não forem cometidos excessos. Clubes de futebol podem atrair novos fãs, ter alcance grande de mídia e, portanto, valor de patrocínio maior. Porém, dividem a comunidade, pois trazem consigo as rivalidade do futebol. Uma marca associada ao futebol só teria efeito positivo caso houvesse uma segunda equipe brasileira neutra. Como hoje há condições apenas de uma equipe profissional no Brasil, considero um acerto a escolha de uma marca neutra.

Dito isso, o que pensar da marca “Cobras”? Quanto ao design da marca e de seus uniformes, estou longe de ser especialista para cornetar com propriedade. Eu gosto de ter as cores nacionais (verde, amarelo, azul, branco) combinadas, pois demarca o vínculo com a seleção nacional. Tupis (a seleção) e Cobras (a franquia) são, na prática, a mesma coisa. A diferença real é que os Cobras terão o reforço de atletas argentinos, que prometem ajudar na evolução dos atletas brasileiros. Por isso, o diálogo entre as duas marcas é essencial. A cobra é um símbolo forte no folclore brasileiro, na mitologia indígena – portanto, há sentido na marca.

No entanto, no passado recente defendi que deveria haver um processo de escolha popular da marca, pois ajudaria a consolidar o laço entre fãs e time. Com mudança de CEO, renovação de Conselho e a busca por soluções em meio à pandemia, demorou-se demais para que uma decisão sobre a marca fosse tomada (igual em 2020, quando o Corinthians foi anunciado em cima da hora) e, portanto, não houve margem de tempo para um processo de participação popular, já que a competição começará em março. Diante de tal circunstância, a solução do uso da marca “Cobras” fez sentido. A marca “Cobras” já havia circulado pelo idos de 2018, quando a Confederação estudava substituir o Tupi, e se tornou a escolha lógica.

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Agora, há ainda o questionamento em setores do rugby brasileiro sobre a importância ou a necessidade de se ter um time profissional disputando a SLAR. Primeiramente, a questão de ter uma equipe profissional é basicamente uma questão de coerência com os objetivos. Se o Brasil quiser chegar à Copa do Mundo, este é o único jeito, uma vez que a concorrência igualmente se profissionalizou. É o velho problema da “Rainha de Copas”, lembra? Vale a pena a leitura.

Evidentemente, a questão pertinente é a sustentabilidade financeira do projeto. A liga precisa amadurecer para a Confederação efetivamente conseguir ter parceiros para sustentar a longo prazo o projeto. Quanto a isso, a análise nos próximos meses precisará ser com relação à capacidade da SLAR como um todo de ter um projeto comercial sustentável. Os Cobras são apenas uma parte disso.

O que é claro é que o rugby profissional precisa ser trabalho numa esfera própria, pensada e planejada para tal. O rugby brasileiro de clubes, por exemplo, hoje não poderia sustentar um projeto sustentável de profissionalismo. Nenhum (e deu digo nenhum, mesmo) clube brasileiro hoje tem tamanho (número de jogadores, sócios, estrutura) para seriamente pensar em profissionalismo. Se olharmos para todos os países próximos ao Brasil no Ranking Mundial masculino (Portugal, Chile, Holanda, Bélgica, etc), o Brasil é, sem dúvida, o que tem os menores clubes, em termos de número de membros. O foco precisa ser expandir o número de jogadores, de pessoas engajadas nos clubes, em todas as categoria. É lógico que alguns clubes podem aspirar a um modelo semi profissional, como ocorre em outros países, mas o foco precisa ser o de desenvolver as instituições como clubes, isto é, como centros de prática esportiva, de formação de praticantes.

Os clubes são essenciais para o sistema e o que nasce com os Cobras é o tal falado sistema piramidal, consagrado em países do Hemisfério Sul, que tem os clubes na base e entidades profissionais acima, em relação quase simbiótica. É realmente difícil no Brasil absorvermos o que significa tal modelo porque estamos acostumados com o modelo do futebol, que tem os clubes como organismos totalmente independentes e cooperação praticamente zero entre eles. Porém, profissionalismo sustentável num esporte pequeno requer um sistema bem pensado funcionando – e não o “cada um por si”. O topo e a base precisam trazer benefícios numa via de duas mãos e isso estará no centro das discussões uma vez que o sistema comece de fato a operar.

Cobras são, portanto, um acerto, mas a real discussão virá com o tempo apenas. No mundo pós pandemia, a SLAR terá efeitos diretos no rugby de clubes e, aí sim, a discussão ganhará um conteúdo mais profundo. Ou, pelo menos, deverá.

1 COMENTÁRIO

  1. Concordo que foi um acerto criar um marca propia e acho que a unica maneira de seguirmos em evolução no rugby brasileiro é fazer a estrutura toda evoluir. Com os clubes na base sendo fortes ( e ai sim termos clubes de futebol) suportando os Cobras, que dessa forma poderão suportar os Tupis.
    A CBRU tem de trabalhar em projetos estruturados para campeonatos adultos e juvenis para que os clubes possam se desenvolver com objetivos claros.
    Claro que para tudo isso é necessário $$$ e ai é aonde as coisas podem se complicar, mas também deve ser algo que a CBRU e os clubes tem de trabalhar.