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Thomas Hackmann nasceu designado pelo sexo feminino mas se identifica com o gênero masculino, isso faz dele um homem trans. No alto da sua juventude, aos 24 anos, atleta de duatlo, ciclista, conhece o Rugby e passa a praticá-lo no Tamanduás-Bandeira, clube LGBT da capital paulista. Talvez por sua infância completamente aberta à prática esportiva, Thomas defende com tanto rigor que o esporte, inclusive o Rugby, seja aberto para qualquer pessoa, inclusive os homens e mulheres trans.
Desde criança, se incomoda ao ser lido como mulher “quando é criança, tudo é dividido entre menino e menina, né? E me incomodava muito isso de ser sempre colocado no grupo das mulheres. Quando eu fui crescendo, a pressão foi aumentando“. Ao mesmo tempo que Thomas vivia uma infância no gênero “errado”, era incentivado pela família a praticar esporte “Eu tive uma infância muito mais livre que a das meninas. Eu fiz judô, meus pais me deram skate, eu tinha prancha de surf, sempre andei de bicicleta.. Esse tipo de coisa que as meninas quando são crianças não são incentivadas a fazer“.
Nos esportes individuais que Thomas está habituado a praticar, não encontrou problemas relacionados à transgneridade: chega pronto, passa pela competição e vai embora. A situação toma outra faceta quando é o esporte coletivo em questão, e ainda assim decidiu enfrentá-lo. Foi apresentado ao Rugby porque viveu como intercambista na Austrália. Mas foram os algorítimos do Facebook os responsáveis por Thomas integrar, hoje, o Tamanduás-Bandeira “O Facebook mostrou o evento do treino que o time LGBT. E fazia um tempo que eu tava querendo participar de esporte coletivo, só que não gosto de futebol, e não conhecia outros times de outros esportes diferentes. Quando apareceu chamando pro treino aberto, decidi ir”
Logo de cara, convida seus amigos trans a fazerem parte do time, para estimular a entrada de outras siglas, para além da G, na equipe. O esforço tem dado certo! Atualmente, o Tamanduás já conta com 3 outros homens transsexuais além do Thomas, “Eu tô gostando bastante, minha namorada diz que é muito violento.. Mas eu adoro aprender e pretendo continuar por um bom tempo“.
A realidade de pessoas transsexuais é bem cruel, e as outras urgências como: exclusão escolar, baixa renda, baixo nível de empregabilidade, agressões e violências nas ruas, estupros corretivos, assassinatos, negligência familiar e mais uma lista de motivos tristes, faz a prática esportiva não ser uma das prioridades, “a última coisa que a pessoa vai pensar é em praticar um esporte. Pra começar a jogar Rugby você precisa de uma chuteira, precisa se locomover até o lugar do treino, isso já é um gasto que a pessoa vai precisar desprender.. E tem mulheres transsexuais que não se sentem confortáveis no esporte por toda aquela história que são homens competindo contra mulheres“. Além das questões citadas, ele acredita que as pessoas trans que chegam ao esporte competitivo ou de alto rendimento também são excluídas, “inclusive tem muito atleta trans que se assume depois da vida olímpica, é uma pressão muito grande… Ou a pessoa acaba se assumindo depois ou sai do esporte”
O atleta faz análises contundentes sobre o acesso (ou não) ao Rugby Brasileiro “Via de regra, o esporte é algo exclusivo no Brasil, né? Pegando o Rugby, por exemplo, as pessoas não o conhecem.. Quem conhece tem uma base cultural maior, ou quem está no lugar certo na hora certa. Mas quem conhece o Rugby no Brasil é classe média. A prática esportiva requer um investimento de tempo e dinheiro, e tem a coisa do corpo.. Tem um corpo esperado pro esporte”
Thomas viveu anos tentando aceitar algo que não é, e se esforçando pra enxergar que era uma mulher lésbica, apenas. Aos 18 anos, o jovem descobre a existência de homens trans e finalmente se vê num caminho. Aos 20, se entende como homem transsexual, e sofre com o medo da rejeição pela família “Eles não gostam, mas eu dei um ultimato ‘ou vocês aceitam, ou eu tô fora da vida de todos vocês‘”. Enfrentou dificuldades como não encontrar emprego por ser transsexual, passou por demissão pelo mesmo motivo, evita se expor na grande mídia em geral, “Tudo que é cobrado dos homens cis, é cobrado ao dobro dos homens trans“.