Foto: Mike Lee - KLC/World Rugby

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ARTIGO OPINATIVO – Não vem sendo um desafio fácil para a Seleção Brasileira Feminina de Rugby Sevens militar entre os melhores times do mundo. A promoção à elite mundial em 2019 recolocou o Brasil entre as 11 melhores do planeta e o resultado foi uma temporada 2019-20 sofrida, com 29 derrotas em 30 jogos. Depois veio a pandemia, a troca de treinador (com a saída de Reuben Samuel para a promoção de Will Broderick) e um torneio olímpico em Tóquio nada fácil.

Assuntos para se destrinchar acerca desses fatos não faltam. Primeiramente, é essencial colocar tudo sob uma perspectiva: o Brasil é uma seleção da elite mundial, um feito imenso, sobretudo para um país onde o rugby tem bases tão frágeis, com categorias juvenis ainda diminutas e clubes que ainda têm muito trabalho pela frente para se estruturarem. Por outro lado, o Top 10 do mundo do sevens feminino é povoado por países que são fortes também no rugby XV feminino (com as exceções de Fiji e Rússia) e têm uma cultura de rugby mais consolidada, com o esporte mais difundido do que por aqui. Por si só, esse contexto já torna ainda mais notável a posição conquistada pelas Yaras no mundo do rugby e ainda maiores os seus desafios.

 

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Evolução virou clichê: todo mundo está evoluindo

O que os Jogos Olímpicos provaram – e que já era claro no Circuito Mundial – é que todas as seleções estão evoluindo. Enquanto o Brasil evolui, suas concorrentes também evoluem. Não se trata de uma corrida contra adversárias estagnadas. Fiji teve uma mágica atuação em Tóquio escalando algumas atletas novatas, que mal tinham experiência com o esporte nesse nível. Mas, o rugby é uma paixão nacional e o talento pôde florescer. A França é uma potência no rugby XV e estava claro que era questão de tempo para começar a ser uma forte candidata à medalha de ouro. Enquanto isso, bastou o Canadá viver uma crise interna que despencou da medalha de bronze no Rio para apenas o 9º lugar no Japão, mesmo com um elenco recheado de medalhistas. O sevens feminino está mais dinâmico do que nunca.

Para o Brasil, interessa olhar para o desempenho de seleções que não estão na primeira divisão do Circuito Mundial. Com duas seleções da primeira divisão mundial – Irlanda e Espanha – de fora dos Jogos Olímpicos, por conta da competitividade do Pré Olímpico europeu, houve espaço para a China e o Quênia brilharem. As duas surpresas galgaram um lugar no Top 10 de Tóquio – enquanto Brasil e Japão terminaram com resultados piores do que almejavam.

A força da seleção chinesa foi recebida até com certa surpresa, uma vez que o país havia sido rebaixado da primeira divisão mundial na temporada 2018-19 e não vinha impressionando naquele momento. Mesmo no rugby asiático, as chinesas vinham sendo a segunda força, atrás do Japão – e nos Jogos Olímpicos veio uma inspiradora vitória chinesa sobre as japonesas. Já o Quênia jamais conseguiu promoção à primeira divisão mundial, mas encarou as seleções da elite como uma igual e deixou a clara impressão de que pode mais, se ganhar a oportunidade de jogar mais nesse nível.

 

Itália mostra uma cilada ao Brasil

Desde 2019, o Brasil vem experimentando a mesma cilada conhecida tão bem pela Itália no rugby XV masculino. O Brasil conquistou o direito de estar entre as melhores do mundo e joga a maior parte do ano contra seleção de nível muito elevado, o que significa que as Yaras acabam tendo muito mais derrotas do que vitórias ao longo do ano. É normal e esperável.

Um dos tipos de comentários mais imbecis vistos nas redes sociais do Portal do Rugby é a reclamação corriqueira de que falamos muito de derrotas das Yaras. Oras, as pessoas querem que simplesmente não noticiemos os resultados? Querem que inventemos alguma asneira ou escondemos algum placar? Perder não é o problema. O problema é que as derrotas enganam quem não acompanha o esporte de verdade. O Brasil perde muito porque só joga contra seleções fortes. As Yaras perdem porque estão entre as melhores. É a mesma coisa que ocorre com os italianos há anos. Em época de Jogos Olímpicos, isso significa ter que lidar com a incompreensão da parte de torcida e dos jornalistas pouco familiarizados com o rugby, que caem de paraquedas no esporte.

A ascensão de China e Quênia, a paridade entre Brasil e Japão e o potencial da África do Sul (que venceu o Quênia no Pré Olímpico, mas abriu mão da vaga em Tóquio por decisão de seu Comitê Olímpico) provam que o Circuito Mundial de Sevens precisa se expandir das atuais 11 seleções fixas para 15. Isso daria ao rugby feminino igualdade com o masculino, que já conta com 15 seleções em sua primeira divisão.

 

O risco do rebaixamento

Hoje, o risco de rebaixamento no Circuito feminino é muito grande para seleções como Brasil, China, Japão ou Quênia. Como a segunda divisão mundial não está consolidada, o rebaixamento pode ter um alto preço.

O Top 10 do mundo continua evoluindo e é preciso também garantir que um bloco de outra dezena de seleções tenha condições de acompanhar essa evolução. Isso só será alcançado com a expansão da primeira divisão aliada com a consolidação de um circuito de segunda divisão.

É bom enfrentar seleções melhores, mas é importante também ter mais oportunidades de celebrar vitórias. Para isso, é essencial reconhecer que o Circuito Mundial precisa ser expandido.