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ARTIGO OPINATIVO – O caso da não filiação da Bahia à Confederação Brasileira é emblemático. Primeiro, porque após 25 meses de espera por uma decisão, a Bahia teve filiação rejeitada por conta de um critério que não corresponde à realidade das federações filiadas e que será alterado em breve.
Esclarecendo, a ata da reunião do Conselho da CBRu atribuiu à ausência de 4 árbitros nível 2 (algo exigido pelo estatuto da entidade) o motivo da não filiação, ainda que 3 estados hoje filiados não contem com tal número de árbitros (PR, SC e MG). O número de árbitros nível 2 exigidos cairá para 2 assim que as alterações ocorrem. O que isso significa? Que a Bahia esperou 25 meses (mais de 2 anos) para ser rejeitada na mesma reunião que aceitou modificar o critério que a deixou de fora.
O compromisso que a CBRu assumiu agora é de convidar árbitros baianos para o próximo curso e de aceitar a seleção baiana na Copa Cultura Inglesa (o Brasileiro Juvenil de Sevens). A participação baiana na competição já havia sido anteriormente solicitada pela Federação de Rugby da Bahia e rejeitada.
A questão da filiação da Bahia é dramática, pois os baianos foram a fundo na meta de serem filiados expondo que o sistema – ao menos até agora vigente – simplesmente não foi pensado em como integrar o território nacional, tampouco em ser condizente com a situação das próprias federações filiadas. O sistema não foi montado baseado no mérito (pois tem critério que os filiados não atendem) nem na integração (se a Confederação é brasileira precisa ter claro onde está cada região em sua organização).
As respostas foram justamente resposta a todo um desconforto causado com a situação. Não foram fruto de nenhum plano de como abranger todo o país dentro do sistema ou de guiar novos estados para dentro do sistema. Que em 2010 não houvesse um plano claro por conta de tantas outras prioridades é compreensível, mas em 2019 não mais.
Para que serve filiação? Questão de legitimidade
Parece-me incrível como que a questão da filiação de novos estados é entendida de forma equivocada por muita gente. Há dois pontos centrais que atrapalham a compreensão:
- Muita gente interpreta que a filiação de estados do Nordeste, Norte ou Centro-Oeste seja indesejada porque encareceria muito os Campeonatos Brasileiros de Rugby XV (Super 16 e Taça Tupi). Tal interpretação é equivocada por três motivos:
- 1 -O Departamento de Torneios da CBRu já solucionou esse problema com a regionalização. Viagens distantes só ocorreriam em uma fase de mata-mata. A participação de times de fora do Sul e Sudeste seria condicionada pela introdução de um grupo inteiro para a nova região;
- 2 – Qualquer questão relativa a torneios independe de filiação. Se houver falta de recursos da CBRu para arcar com viagens, ela mesma pode resolver a questão a partir do regulamento de seu torneio. A filiação à CBRu não está diretamente relacionada a isso;
- 3 – A CBRu já abre espaço hoje para equipes de fora dos 6 estados filiados (SP, RJ, MG, PR, SC e RS) em competições de sevens, masculino (Xavantes) ou feminino (Melina, Delta). E agora as seleções baianas foram convidada à Copa Cultura Inglesa;
- Muitos acreditam que o motivo de filiação de um novo estado à CBRu é conseguir vagas em torneios nacionais. Esse não é o motivo principal e nem deve ser. Ele é um entre vários motivos e trata-se de um motivo para ser discutido em um segundo momento, isto é, após a filiação;
- Muitos alegam que a quantidade de rugby dos 6 estados é bem maior do que no restante. Isso não é nem verdade, nem razoável de se alegar, pois:
- 1 – Basta comparar a quantidade de atividades de alguns dos 6 estados com os demais nos últimos anos. Nós elencamos: clique aqui para 2017 e aqui para 2018;
- 2 – Esporte amador se beneficia de distância curtas, isto é, de densidade. Quanto mais equipes próximas umas das outras, mais atividades acontecem, estímulo é ganho por todos os participantes e há expansão.
- O que se vê no Nordeste, Norte ou Centro-Oeste não é falta de vontade, nem mesmo ausência de pessoas capazes. São condições mais difíceis, que começam por distância entre cidades (e custo de transporte), quantidade de pessoas com recursos para se focarem em um esporte amador e presença de praticantes com experiência grande fora dessas regiões (estrangeiros ou pessoas de estados com rugby mais antigo);
- Em suma, as metas para uma região precisam ser feitas a partir da leitura dos contextos. Fazer rugby próximo de outros clubes é muito mais fácil (ou menos difícil) do que fazer rugby distante de outros clubes;
Portanto, para que serve filiar seu estado à CBRu? Há duas razões que são muito mais importantes do que qualquer vaga em competições.
- O motivo principal para uma federação ser filiada à CBRu é: LEGITIMIDADE. Para dentro do estado e para fora.
- Em outras palavras, a partir do momento que uma entidade é filiada ela está tendo seu funcionamento chancelado pela CBRu, que é filiada ao World Rugby (federação internacional) e ao COB (Comitê Olímpico do Brasil), que são filiados ao COI (Comitê Olímpico Internacional);
- Chancelado? Sim, a partir do momento que a federação é aceita, a gestão (as pessoas) eleita de acordo com o estatuto é a legítima (verdadeira, oficial) representante do rugby daquele estado. Isso é ESSENCIAL para:
- 1 – Impedir que qualquer um se diga o representante do rugby do estado. Isso torna mais difícil a vida de charlatões;
- 2 – Reduz o risco de rachas de clubes, isto é, garante estabilidade ao trabalho e coesão entre os clubes;
- 3 – Permite conversar formalmente e com respaldo com patrocinadores e poder público. Qualquer um pode procurar apoiadores e governo, mas ter a chancela do reconhecimento da CBRu (portanto World Rugby e COB, portanto COI) oferece outro patamar e credibilidade à gestão;
Basta ver a história recente do rugby no Nordeste ou Centro-Oeste para entender como a questão da legitimidade é central.
Por fim, já ouvi que a CBRu poderia fazer a interlocução, a intermediação, para uma entidade que ainda não seja filiada conseguir avançar com algum projeto. Tal ideia pode fazer sentido, mas na prática é irreal. Primeiramente, porque a CBRu tem outras prioridades, como sempre é alegado sobre o assunto dos demais estados. E segundo que se ela demorou 25 meses para analisar a Bahia, a chance de se perder uma oportunidade por conta de falha nessa comunicação e demora por prioridade é imensa. Torna o sistema totalmente ineficiente. É justamente por isso que abaixo da Confederação existem Federações.
Ou seja, filiação garante legitimidade, seja para trabalhar junto dos clubes do estado, seja para trabalhar com respaldo e eficiência com governos e patrocinadores.
Como caminhar adiante?
Ao longo dos 10 anos de Portal do Rugby já tocamos incontáveis vezes no assunto e sugerimos muitas coisas. Neste momento, é importante seguir um raciocínio:
- Faz sentido a CBRu estabelecer metas para as federações. Ter árbitros Nível 2 é importante, assim como tudo o que é pedido no estatuto. Em outras palavras, é importante para o futuro colocar a barra de exigências lá em cima;
- Mas se há uma barra alta, são necessárias barras intermediárias para se seguir escalando;
- O que é essencial para uma federação existir é ela ser a representante dos clubes de seu estado ou região. Isto é, federação é quem representa;
- Portanto, uma vez que uma federação prova representar uma comunidade e segue princípios legais (estatuto, eleições, documentação em dia), não há razão para não incorporá-la, isto é, garantir sua legitimidade;
Uma vez incorporada, uma federação pode ser obrigada a ir atingindo objetivos para poder receber mais auxílios, verbas, vagas em competições, cursos, etc. Isto é, criar níveis de filiação! Cada um com um benefício. E todas devem ser reavaliadas periodicamente podendo ganhar ou perder benefícios. É o caminho para um sistema de méritos.
Na minha opinião, as metas devem ser balizadas pelos contextos de cada região, pois o esporte não está pairando fora da sociedade ou da geografia. Mas esse é um debate enorme para um outro momento. O importante agora é pensar em um sistema objetivo.
World Rugby tem 5 categorias de país na prática, sabia?
Eu não concordo com o sistema de votos do Conselho do World Rugby, mas ele expõe que a própria federação internacional tem um sistema com níveis distintos:
- 10 países têm 3 votos no Conselho (Inglaterra, Gales, Escócia, Irlanda, França, Itália, Argentina, África do Sul, Austrália e Nova Zelândia);
- 1 tem 2 votos: Japão
- 6 têm 1 voto (EUA, Canadá, Geórgia, Romênia, Fiji e Samoa);
- 85 países são membros plenos sem votos diretos (apenas via federações continentais), entre eles o Brasil;
- Outros 17 países são membros associados (uma categoria menor, transitória);
- E há ainda uma sexta categoria que são países filiados às suas federações continentais, mas sem filiação direta ao World Rugby. Exemplos nas Américas são Bolívia, Equador, Honduras, El Salvador…
O problema desse sistema é sua elitização quanto às decisões e, acima de tudo, o fato de não haver qualquer critério objetivo para os 17 países privilegiados com votos diretos. Mas a CBRu poderia ter um sistema semelhante, porém montado por critérios objetivos abertos a ascensão e queda de todos os membros dentro do sistema – e não simples privilégios elitistas dos fundadores (os fundadores, no caso do World Rugby, leiam-se Inglaterra, Gales, Escócia, Irlanda, França, África do Sul, Austrália e Nova Zelândia). Se a CBRu merece mais espaço dentro do World Rugby, outros estados merecem um lugar dentro da CBRu. É lógica.
Erro evitável e custoso
Tudo isso expõe uma coisa óbvia e dolorosa de se constatar: a CBRu está desgastando sua imagem dentro da comunidade do rugby à toa.
Oras, a CBRu faz um magnífico trabalho no nível das seleções. Tem uma relação excelente com patrocinadores, ainda mais após entregar um evento do nível dos Maori All Blacks no Morumbi. Evoluiu na questão dos cursos com a Superweekend, que é um grande instrumento de desenvolvimento. Tem o Portal de Governança, para deixar abertas suas decisões.
Desgastar sua imagem por pura ausência de um plano claro e justo para as centenas de rugbiers espalhados fora dos 6 estados federados e transmitir uma mensagem tão excludente quanto essa é o tipo de coisa absolutamente evitável por bom senso.
Já se arrastou demais achar uma solução formal para o problema do rugby de 21 estados brasileiros. O papo do mérito já ficou vazio. A ideia do que é ou não prioritário já não é mais resposta válida. É preciso a CBRu liderar esse processo rumo a uma solução real. Afinal, trata-se de um erro de liderança.
Muito interssante! Thumbs up!
Existe rugby na Bahia. Tanto no XV quanto no sevens o calendário tem movimento e as coisas acontecem. Além disso, somos referenciados em Alagoas e Sergipe. Recusar a filiação da FRB foi um duro golpe da CBRU, que impede o crescimento do esporte num terreno fértil e gera uma certa antipatia com os amantes e praticantes do esporte em Salvador e interior. Acho que rende um ovalados um amplo debate sobre o assunto.